A música e o significado


“Música”. São seis letras. Nessa tipografia, a primeira letra é formada por quatro segmentos unidos em três vértices. Já a terceira é um traço sinuoso. A quinta, por sua vez, se aproxima de um semicírculo. A conjunção dessas letras forma uma palavra que nos remete a uma ideia. Signos que, unidos, resultam em algo novo. Algo que não tem a ver com a sua forma, o seu desenho, mas com uma ideia que se convencionou atribui-la.

Essa é a base da semiótica, o estudo dos sinais. Na sua expressão mais elementar, a semiótica estuda a interação do signo, do significante e do significado na comunicação.

Umberto Eco nos ensina que signo é “aquilo que está no lugar de outra coisa[1]”. Daí porque quando encaramos as letras, a última coisa em que colocamos a atenção – se é que o fazemos – é no seu desenho, na sua forma.

Mesmo no mais absoluto silêncio, somos às vezes capazes de ouvir o texto que lemos, com nossa própria voz, por exemplo. No texto, a atenção desliza não só para uma ideia de como essa palavra soa, mas também para o conceito guardado detrás daquele conjunto de sinais. Sinais estes, no caso, cujo significado se extrai do sistema alfabético.

Ou do sistema de notação musical.

Assim como no discurso verbal, a música também contém um sistema que expressa sons através de símbolos que chamamos de notas musicais. E o que é curioso nesse sistema, pelo menos em língua portuguesa, é que “nota musical” se refere tanto ao símbolo como ao seu significado. O som em si.

partitura com notas musicais

“Nota musical” se refere tanto a som como sua grafia. O músico que domina esse universo confunde o símbolo e o significado, pois, para ele, ambos são som. Ele é, portanto, capaz de ouvir com os olhos e ver com os ouvidos.

Mesmo no mais absoluto silêncio, o fato de aquele grafismo significar algo permite a capacidade de ouvir aquele som por conhecer previamente uma ideia de como aquele signo soa. Transforma-se imagem em som, mesmo no silêncio.

Mas uma questão pode passar desapercebida. Ser capaz de ouvir o que leu é o mesmo que entender? Afinal, no mundo das letras, quem nunca leu e releu um livro, discerniu suas palavras, mas não entendeu nada?

A música também é uma linguagem. Compreendê-la é mais que reproduzi-la. É também criar a partir do mundo dos sons e dele se apropriar, conformado nas regras que o governam.

Entender a música é algo que pode ser encarado de duas formas distintas. A primeira tem a ver com a compreensão de como os sons se relacionam e se estruturam. A outra tem a ver com a hipótese de os sons, agregados de uma certa maneira, transmitirem significado. Tal como as palavras.

Bohumil Med – um extraordinário autor tcheco de valiosas obras didáticas sobre música no Brasil – lembra-nos que a música é muito mais do que a grafia musical e o seu significado. Dominá-la no seu todo é estudar suas muitas disciplinas.

Harmonia, arranjo, improvisação, regência e composição são exemplos. Saber como combinar sons simultâneos, criar uma obra, gerir músicos em torno de uma mesma obra, inventar sons instantaneamente – tudo isso é possível ser estudado. Ainda que haja músicos talentosos que, por desígnios insondáveis, produzam coisas impressionantes sem terem estudado. O talento é só o primeiro passo.

Essas disciplinas formam algo que se assemelha à sintaxe, tal como se aprende na escola em Língua Portuguesa[2]. Estuda a estrutura e a construção dos sons para formar frases musicais. A combinação desses sons gera um sentido cuja consequência é o belo que ouvimos.

Mas há a segunda forma possível de encarar o que seja entender a música. Seria a possibilidade, assim como as palavras, de o som transmitir ideias. De que a música conteria semântica.

Contra isso, argumenta o filósofo Vladimir Jankelevitch, “a música não é, então, nem uma “linguagem”, nem um instrumento para comunicar conceitos, nem um meio de expressão utilitária[3]”. Até mesmo na música cantada, sustenta que “a relação da música com o texto, longe de assentar num paralelismo exato, surge como uma reação indireta e muito geral, um simples efeito de conjunto.[4]

Descrição real ou ingenuidade retórica? Insondável.

É verdade que a música, como a entendemos, não comunica como numa conversa. Mas também é verdade que ela pode disparar ideias comuns aos ouvintes. Referir-se a um país, a um tipo de paisagem, a um estado de espírito. Não se diz por aí, afinal, que música é a linguagem universal?

[1] ECO, Umberto. Tratado Geral de Semiótica. São Paulo: Ed. Perspectiva, 2014, p. 11. [2] Umberto Eco, inclusive, sustenta que a música é um sistema semiótico puramente sintático e sem ‘espessura’ semântica aparente. Cf. ECO, Umberto. Op. cit., p. 77. [3] JANKELEVITCH, Vladimir. A música e o inefável. Lisboa: Almedina, 2018, p. 75 [4] Idem, p. 65.

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